1. Em 29 de Setembro, na reunião extraordinária da Assembleia de Freguesia, a Junta pretendeu obter autorização dos membros da Assembleia para se apossar de um terreno do Brejo por usucapião, para depois o entregar de "mão beijada" à Câmara.
O MOIA chamou a atenção para o facto do terreno ser terreno baldio e, por isso, não ser propriedade da Junta, mas sim propriedade da comunidade olivalense, devendo a questão ser tratada à luz da Lei dos Baldios(ver nosso boletim nº 4).
2. Ficou decidido que o assunto voltaria à apreciação da Assembleia, caso a Junta conseguisse demonstrar que o terreno não era baldio como defendia.
3. Junta de Freguesia e Câmara numa aliança cimentada por uma ignorância atrevida, por uma arrogância não consentânea com quem se reclama de democrata e por uma falta de sentido de responsabilidade e bom senso insistem contra tudo e contra todos para que a posse por usucapião seja reconhecida e o terreno seja doado à Câmara que tão bem soube contar "o conto do vigário" na mira de conseguir um "negócio da china".
4. Submetido o assunto à votação, obteve-se o seguinte resultado: 4 votos favoráveis (3 do PS e 1 do membro ex-moia), 3 abstenções do PSD e 2 votos contra do MOIA que entregou a declaração, abaixo transcrita, para constar em acta.
"DECLARAÇÃO (DE VOTO)
1. IntroduçãoÉ tempo de começar a “arrumar a casa”, como coisa necessária para se falar e encetar medidas de desenvolvimento e melhoria rumo ao progresso que todos, teoricamente, defendem e, depois, na prática, complicam enveredando por caminhos tortuosos, ficando tudo na mesma, com a agravante de ser mais uma ilegalidade ou série de ilegalidades que se cometem.
Nós ao levantarmos a questão dos terrenos baldios, pugnamos para que as pessoas possam dispor dos mecanismos necessários para a legalização dos terrenos onde se encontram implantadas as suas casas e outros meros prédios rústicos, tomados em tempos, mais ou menos remotos, por arrendamento e ou aforamento. Também entendemos quanto será vantajoso para a Junta de Freguesia poder ver os terrenos que são baldios deixarem de o ser e passarem a fazer parte do seu domínio privado. É incontornável que estes dois desideratos passam sempre pela constituição da Assembleia de Compartes e respectivos órgãos, democraticamente eleitos, e não por um mero “decretar” de usucapião. Quem defende a posse por usucapião não sabe o que é um baldio, desconhece a história dos baldios e não se interessa pela história do Olival. Mas, mais grave do que tudo isto, é escrever sobre o assunto, à laia de parecer, com afirmações como esta, que é simplesmente confrangedora:
“O prédio pertence ao domínio privado da Freguesia do Olival, porque desde 1950 consta na matriz predial rústica, inscrito a favor da autarquia”.
Não deixa de ser curioso que, não obstante isto, em 13 de Maio de 1955, a Junta de Freguesia, numa relação dos baldios que enviou à Câmara, faça constar o baldio do Brejo. Para além disto, a inscrição matricial do terreno em nome da Freguesia foi indevidamente efectuada, como tantas vezes acontece e aconteceu por este País fora
Outra afirmação não menos confrangedora é “em algum momento, o local em causa foi considerado baldio, essa classificação do terreno não faz qualquer sentido, em virtude de nunca ter sido administrado por uma Assembleia de compartes”
Mas quem é este(a) iluminado(a) que perante a certeza que os documentos evidenciam se atreve a esta afirmação que é do mais gratuito que há? Mas quem é este(a) troglodita que tem a desfaçatez de por em causa a sanidade mental daqueles que serviram o Concelho e a Freguesia, pelo menos desde a década de 20 do século passado? Então, quem despachou, por exemplo, em 1920 que o cemitério iria ser transferido para os terrenos baldios do Brejo não estava na plenitude das suas faculdades? Quem autorizou a mudança da feira dos 22 de Aldeia Nova para os terrenos baldios do Brejo estava a sonhar? Então aqueles que serviram a Junta nas décadas de 30, 40 e 50 que deram o seu melhor, registando tudo o que de relevante dizia respeito à Freguesia, nomeadamente a relação de baldios existentes em cada momento e em cada lugar da Freguesia, a pensar também nos vindouros, não merecem respeito e reconhecimento? Quem faz tal afirmação, no que à Assembleia de Compartes diz respeito, não se deu ao trabalho de ler e interpretar a lei n.º 68/93 de 04 de Setembro (Lei dos Baldios actual). Ignorou-a ou, na melhor das hipóteses, soletrou-a e nada mais. É pouco para quem tem a pretensão de emitir pareceres sobre o quer que seja.
2. O terreno é baldio ou não, eis a questão. Esta é a questão de fundo
a. Actas da Junta
• Acta n.º 7 de 01 de Junho de 1943 refere o terreno baldio do Brejo
• Acta n.º 3 de 01 de Março de 1945 refere o terreno baldio do Brejo, por três vezes
b. Outros documentos que existem nos arquivos da Junta de Freguesia
• O livro de registo dos baldios faz constar os terrenos do Brejo
• A relação dos baldios enviados à Câmara, em 13 de Maio de 1955, contempla os terrenos de baldio do Brejo
• A relação por ordem alfabética dos foreiros e rendeiros dos baldios da Junta, refere baldios do Brejo
c. Edital da Junta de Freguesia de 24 de Outubro de 1946
Põe em vigor uma postura sobre os baldios e no artigo 11º diz :“são baldios a charneca do Brejo, etc.
Este documento para além de provar inequivocamente que o terreno do Brejo é terreno baldio, prova outra coisa não menos importante: que os povos, efectivamente, até esta data, dispunham e usufruíam em pleno dos baldios, arrancando e cortando árvores, roçando mato, plantando árvores, deslocando-se livremente neles em carros de tracção animal ou motorizados, usando-os para depositar lenha ou outros materiais, extraindo pedra e saibro, etc. Actividades que abusivamente foram proibidas e sobre as quais passaram a recair pesados coimas.
O golpe, em nome de um determinado desenvolvimento, perpetrado pelo Estado Novo, através da Junta Nacional de Colonização Interna, foi desferido e os povos viram ser-lhes negado um direito que gozavam desde tempos imemoriais e que só voltou a ser-lhes reconhecido após o 25 de Abril de 1974.
d. Depois disto, continuar a afirmar que o terreno não é nem nunca foi baldio é a mesma coisa que afirmar que o Olival não existe no mapa ou que pura e simplesmente não existe nem nunca existiu
3. 25 de Abril e o direito aos baldios
A Constituição da República Portuguesa de 1976 reconhece a existência dos baldios e reserva-lhe um lugar de destaque no artigo 89º
Em 1976, os decretos leis n.º 39 e 40º de 19 de Janeiro devolveram o direito aos povos de reaverem os baldios e, face aos entraves que municípios e juntas de freguesia, desde a primeira hora criaram, em 04 de Setembro de 1993, a Lei n.º 68/93 criou um quadro legal mais favorável, sendo difícil às autarquias continuarem a deter os baldios e impossível exigirem a sua posse por usucapião
4. Aqui ao lado, no concelho e freguesia de Pombal, aconteceu, relativamente há pouco tempo, uma questão de baldios entre as populações e a Câmara que acabou por ser decidida em Tribunal, o ano passado em Fevereiro. Pela similitude entre esta questão e a que se verifica no Olival, eis um resumo muito resumido das sentenças que os Tribunais de 1ª e 2ª Instância proferiram
Em 17 de Julho de 1999, um grupo de moradores dos lugares de Arroteia, Outeiro das Galegas, Pousios e Cumieira de Cima da freguesia e concelho de Pombal reuniram-se com o objectivo de criar os órgãos administrativos dos baldios. Como primeira medida constituíram, nesta reunião, uma comissão “ad hoc” e esta, de imediato, decidiu:
Elaborar e afixar no prazo de 10 dias o recenseamento dos compartes dos baldios de Zambujal, Outeiro Pequeno, Pedreira e Cumeadas, todos localizados na freguesia e concelho de Pombal, inscritos na matriz em nome da Câmara Municipal, na respectiva matriz predial rústica da 1ª Repartição de Finanças deste concelho.
Em 29 de Julho de 1999, reuniu a comissão “ad hoc”, tendo aprovado a convocatória da assembleia de compartes e deliberado afixar o recenseamento, entretanto efectuado, bem como enviá-lo à Câmara Municipal.
Em 11 de Agosto de 1999, a comissão “ad hoc”, procedeu a uma convocatória para o dia 29 de Agosto de 1999 para:
a. Aprovar o recenseamento dos compartes
b. Eleger os Órgãos Administrativos dos baldios
• Mesa da Assembleia de Compartes
• Conselho Directivo
• Comissão de Fiscalização
Em 29 de Agosto de 1999, realizou-se a reunião, previamente convocada, tendo sido eleitos estes órgãos
Em 31 de Agosto de 1999 tomaram posse estes órgãos
Entretanto, o Presidente do Conselho Directivo da Assembleia de Compartes instaurou uma acção no Tribunal de Pombal contra o Município de Pombal, alegando que os terrenos referidos são terrenos baldios, pelo que pretendem registá-los em nome da Assembleia de compartes, o que se torna impossível sem que deixe de constar a Câmara Municipal como sua titular na matriz predial.
Objectivamente e concretamente, pede que o réu (Município de Pombal) seja condenado:
a. A reconhecer que os terrenos inscritos nos artigos matriciais rústicos da freguesia e concelho de Pombal sob os n’s 28241, 33814, 756 e 1273 são baldios;
b. A reconhecer que esses terrenos são pertença da comunidade
c. A reconhecer que esses terrenos são administrados através de actos de representação, disposição, gestão e fiscalização pelos órgãos das comunidades democraticamente eleitos;
d. A reconhecer que a inscrição matricial dos terrenos em nome da Câmara Municipal de Pombal foi indevidamente efectuada;
e. A abster-se da prática de quaisquer actos que ofendam a posse dos terrenos pela Assembleia de Compartes;
f. A ver ordenado o cancelamento de quaisquer descrições e inscrições que, entretanto, tenham sido efectuadas ou que venham a efectuar-se na Conservatória do Registo Predial sobre os terrenos em causa.
O réu (Município de Pombal) alegou e pediu o seguinte:
a. Que os prédios estão inscritos na matriz em seu nome porque sobre eles exerce os mais variados actos de posse, nomeadamente:
• Aplicou macadame;
• Nivelou o terreno;
• Removeu terras;
• Cortou matos;
• Plantou e cortou árvores;
• Fez levantamentos topográficos, fotografias aéreas e estudos de forma continuada sem qualquer interrupção, sempre à vista da generalidade das pessoas, sem oposição ou violência de quem quer que fosse;
• Limpou o terreno em acções de prevenção, nomeadamente contra incêndios;
• Abriu caminhos;
• Construiu o campo de futebol, entre outras acções
b. Invoca, ainda, a ilegitimidade da Assembleia de compartes por irregularidades na sua constituição e porque nunca terão existido compartes daqueles terrenos;
c. Alega também haver abuso do direito, por os compartes não invocarem motivo justificado para só agora se constituírem enquanto tal, sendo apenas movidos por desconfiança perante o Município e por egoísmo para com os demais habitantes do concelho;
d. Pede o reconhecimento de que é dono e legítimo possuidor dos prédios por os ter adquirido por usucapião;
e. Que tem o direito de proceder ao registo dos prédios na Conservatória do Registo Predial;
5. O Tribunal depois de analisar a matéria de facto e de direito decidiu condenar o réu, Município de Pombal:
a) A reconhecer que os terrenos inscritos nos artigos matriciais rústicos da freguesia e concelho de Pombal sob os n's 28241, 33814, 756 e 1273 são baldios e enquanto tais geridos e possuídos pela Assembleia de Compartes dos lugares de Arroteia, Outeiro Galegas e Cumieira de Cima, da freguesia e concelho de Pombal;
b) A reconhecer que a administração, representação, disposição, gestão e fiscalização de tais baldios são da responsabilidade das comunidades locais
c) A abster-se da prática de quaisquer actos que ofendam os direitos da Assembleia de Compartes;
d) A reconhecer que a inscrição matricial dos terrenos em nome da Câmara Municipal de Pombal foi indevidamente efectuada, com o cancelamento de quaisquer descrições e inscrições que entretanto tenham sido efectuadas ou que venham a efectuar-se na Conservatória do Registo Predial de Pombal sobre os terrenos em causa.
Pombal, 16/02/2009 (sentença – 1943/03.5TBPBL - processada em 10 folhas/20 páginas) _____________________________________________________________________________
6. DECISÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA
(Apelação n.º 1943/03.5TBPBL)
Inconformado, o réu (Município de Pombal) apelou para o Tribunal da Relação que ao analisar a matéria de direito afirma a páginas tantas que os actos praticados pelo réu nos terrenos foram na qualidade de mero detentor e não de verdadeiro possuidor, não sendo, por isso, atento o conceito de posse plasmado no art.º 1251º e seguintes do Código Civil, capazes de fazer operar a usucapião e decidiu nos seguintes termos:
“Face ao exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, julgando-se a apelação improcedente e confirmando-se a douta sentença recorrida”
Coimbra, 2009/10/27
7. Concluindo
a. O terreno em questão é terreno baldio, segundo documentação vária, existente nos arquivos da Junta de Freguesia e, segundo o testemunho das pessoas, principalmente das mais velhas.
b. Ora, porque é terreno baldio, ele é pertença da comunidade e não da Junta de Freguesia. E, porque assim é, qualquer alteração ao seu regime jurídico passa sempre pela Assembleia de compartes, através dos seus órgãos.
c. Na última reunião, em 29 de Setembro, o assunto foi escalpelizado e ficou claro, por parte do MOIA, que o procedimento correcto para solucionar o problema passaria sempre pela a Assembleia de Compartes, a constituir, e a tentativa de aquisição por usucapião, por parte do executivo, seria sempre uma tentativa condenada ao fracasso, porque nenhum notário deste País estará disposto a violar a Lei
d. É estranho que a Junta de Freguesia venha insistir na escritura de justificação. Ao fazê-lo, ou é teimosa ou incompetente ou então as duas coisas, porque complica o que é simples e, ao fim de um ano de funções, ainda não percebeu que o respeito pela legalidade é um dos pilares fundamentais da democracia.
e. O tempo decorrido entre 29 de Setembro e hoje, seria o tempo necessário e suficiente para a solução do problema estar encontrada, se o caminho seguido tivesse sido o caminho que a lei n.º 68 de 1993 aponta: constituição da Assembleia de Compartes.
f. O voto tem três sentidos possíveis e, neste caso:
• O voto a favor é o voto da ilegalidade
• O voto da abstenção é o voto envergonhado que, na prática e objectivamente, deixa caminho aberto à ilegalidade e como diz o ditado “tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica de fora”.
• O voto contra é o voto dos que não aceitam nem pactuam com a ilegalidade e, por isso, é o nosso voto."
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